Por Phelype
Gonçalves
Aluno do 6º período de Jornalismo
O Auditório do Instituto Multidisciplinar (IM) do campus Nova Iguaçu da Universidade
Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) recebeu a segunda edição da semana acadêmica
do curso de Direito do IM, que aconteceu entre os dias 26 e 30 de agosto, e foi
organizada pelo Centro Acadêmico Paulo Cosme (Capac) com total autonomia dos
graduandos de diversos períodos do curso de Direito, além de receber o apoio do
Departamento de Ciências Jurídicas (DCJur) do Instituto.
Com atividades de segunda a sexta-feira, com início
sempre às 8h30 e término às 12h, o evento foi dividido, também, em cinco
subtemas e em cada dia havia uma mesa temática específica. No dia 26, a
abertura ficou por conta de Márcia Pletsch, vice-diretora do IM; de Bruno
Almeida, coordenador do DCJur/IM; e de Pedro Miguel, presidente e representante
da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Jovem.
Márcia falou sobre a importância da universidade
pública e de qualidade e Pedro Miguel do valor de os alunos participarem de uma
semana acadêmica, pois contribui para o crescimento pessoal e profissional do
estudante. Já Bruno Almeida, confirmou as falas da vice-diretora e adicionou:
— Toda universidade pública que queira atingir seu
nível em excelência deve contemplar todas as áreas de conhecimento e, para
isso, é muito importante disseminar a cultura jurídica na UFRRJ, em todos os
níveis, principalmente por não haver essa tradição ainda consolidada na Rural.
Dia
26 — Direitos Humanos
O primeiro dia da II Semana Jurídica trouxe Daniel
de Macedo Alves Pereira, defensor público federal; e Marcelo Freixo, deputado
estadual do Rio de Janeiro. Além dos convidados, a mesa teve a mediação de
Bernardo Brasil Campinho, professor doutor da UFRRJ e da Universidade Federal
da Bahia (UFBA).
Macedo, que é defensor público da União, tinha
como tema “Os direitos humanos e a tutela da saúde”. O advogado contou sua
trajetória até seu cargo atual, falou sobre situações de desvalorização das
profissões de quem deseja cursar advocacia em relação à sociedade, fomentou o
estudo para os graduandos e discursou sobre diversos descasos com a dignidade
da pessoa humana e que, trabalhar para mudar essa realidade, é seu maior
prazer.
— Se existe um funcionário público que acorda
feliz cedo pela manhã, sou eu. Ajudar pessoas que enfrentam lutas ferrenhas,
morte etc. e ganhar por isso não tem preço — disse o profissional ao discorrer
sobre ocorrências nas quais se meteu para contribuir positivamente para a
sociedade. — Se não houvesse o poder público, a OAB e outros órgãos existentes,
cerca de 130 milhões de brasileiros que ganham menos de dois salários mínimos,
excluindo ainda os miseráveis, não poderia arcar com despesas para garantirem
defesa jurídica em suas vidas.
Ainda falando de acontecimentos no seu dia a dia
de trabalho, Macedo citou a importância da imprensa, falou sobre o descaso com
a saúde pública no Estado — pessoas ficavam cerca de 80 dias sentadas em
cadeiras esperando ser atendidas para, então, serem internadas — e “cutucou” as
redes sociais.
— A imprensa tem um papel fundamental. A gente
pode falar o que quiser dela, mas ela surge como um holofote na escuridão —
citou Macedo e finalizou com dicas para os estudantes. — Tenham uma palavra na
cabeça: obstinação, e sejam um diferencial. Fujam dos ladrões de tempo, como o
Facebook, e levem com seriedade seus sonhos.
Marcelo Freixo, com o tema “Os megaeventos na
Cidade do Rio de Janeiro”, palestrou de pé e sempre conciso, discursou sobre os
investimentos de empresas privadas em concessões públicas, como o Maracanã,
sobre o projeto das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) e do modelo de
cidade que o Estado vive atualmente. Irônico, Freixo começou o seu debate
chamando a atenção para as UPPs.
— O que quer dizer UPP? Unidade de Polícia
Pacificadora. Então, existe uma polícia que não é pacificadora, certo? É um
raciocínio de lógica. Além disso, o projeto das UPPs não é um projeto de
segurança pública, é um projeto de cidade — argumentou o deputado ao
caracterizar o porquê das Unidades. — Exceto três delas, todas estão na Zonal
Sul. As que não estão são: a da Favela do Batan, em Realengo; a da Cidade de
Deus; e a do Complexo do Alemão. As duas primeiras se localizam em áreas onde o
controle era de milícias. A última foi onde ocorreram arrastões, queima de
ônibus etc. As UPPs são estrategicamente um projeto de cidade para que os
grandes investidores possam investir nas áreas onde o dinheiro circula no Rio
de Janeiro: a Barra da Tijuca e a Zona Sul.
Perguntado pelo Jornal da Graduação de que forma,
além de votações e protestos, a sociedade pode contribuir e trabalhar em
conjunto com órgãos que lutam pela educação, pela população e pela cidade, e
que quase sempre são abafados por grandes interesses empresariais e midiáticos,
Freixo falou sobre o momento das revoltas contemporâneas e fez uma ponte com
manifestações brasileiras mais antigas.
— Não somos contra a empresa privada. Investimento
é bom. O que não pode acontecer é o interesse privado se sobrepor ao público.
Nenhuma experiência de nossas grandes manifestações como a de 64 e 68 (se
referindo à luta contra o Regime Militar) servem para explicar o que vivemos
hoje. O momento é completamente diferente e essas revoltas atuais tiveram uma
força muito grande graças à internet. As coisas estão mudando e a mídia ninja,
por exemplo, faz hoje o que jornalistas de rádio já faziam antigamente; a
diferença é que agora tem imagem. Além disso, não é verdade que para ser bom
tem de ser privado. Isso é um debate de opiniões que vivenciamos atualmente.
Dia
27 — O Novo Código Ambiental e a Degradação do Meio Ambiente
O segundo dia de palestras teve a sua mesa voltada
para o Direito Ambiental. Duas professoras falaram sobre o tema. A primeira
delas foi Tatiana Cotta Gonçalves Pereira, professora da UFRRJ. A mediação foi
do professor Rodrigo de Souza Tavares, também da Rural.
Tatiana tratou de “O Direito Ambiental no entorno
da Baixada Fluminense” e trouxe suas pesquisas para compartilhar com o
auditório. A docente falou da importância que os profissionais do Direito
deveriam dar para o lado ambiental e apresentou dados críticos de Seropédica e
Itaguaí em relação à poluição, à contaminação do solo e à poluição sonora.
— Seropédica e Itaguaí são áreas de extração de
areia, onde tiram tudo o que precisam e não há nenhum cuidado com o solo. Há
locais que você não pode nem pisar devido ao altíssimo grau de contaminação. O
que falta para as pessoas que trabalham com o meio ambiente, inclusive para os
profissionais de Direito, é a visão de identificação a respeito dos problemas
sociais que são, em sua grande maioria, ambientais — revelou.
Já Sonia Rabelo, ex-vereadora do Rio de Janeiro e
professora da Lincoln Institue of Land Policy, tinha como debate os
“Megaeventos, especulação imobiliária e a mercantilização do meio ambiente no
Estado do Rio de Janeiro”. A professora apresentou panoramas de locais que vão
ser alterados no Rio para abrigar instalações para a Copa do Mundo de 2014 e as
Olimpíadas de 2016, além de mostrar lugares onde haverá desapropriações de
áreas públicas para a propriedade e interesses privados. Reforçou, também, a
necessidade do conhecimento do Direito Ambiental para os graduandos das
faculdades de advocacia.
— O cidadão que não conhece como funciona o
Direito Ambiental não pode colaborar com os avanços jurídicos na área. É
preciso conhecer para saber o que e como mudar. Cerca de 86% da população
brasileira vive nas cidades e, nas faculdades de Direito, sequer a área
ambiental é ensinada — alertou.
Dia
28 — O anteprojeto do novo Código Penal e a Lei Maria da Penha
No terceiro dia da II Semana Jurídica, o tema da
mesa foi Direito Penal. O coordenador do curso de Direito do Instituto
Multidisciplinar da UFRRJ, Paulo Cosme de Oliveira, foi o mediador das
palestras.
A doutora Teresa Maria Rocha de Lima Pezza,
delegada da polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro (PECERJ), falou sobre
“Lei Maria da Penha — Lei 11.340/2006” e citou diversas ramificações que a
norma tem, além de contar a história de Maria da Penha Maia Fernandes e como
ela contribuiu e contribui para a luta em defesa dos direitos das mulheres.
— Maria da Penha teve um marido que tentou matá-la
duas vezes. Na primeira, ele forjou um assassinato: deu um tiro nela, quebrou
vidros e coisas na casa para simular uma briga. Maria não morreu e contou o
caso para a polícia; o marido não foi preso e ela ficou paraplégica. Na segunda
vez, o marido tentou eletrocutá-la e, mais uma vez, ela sobreviveu. Então
começaram diversas manifestações a respeito do caso e criaram a Lei. O marido
foi condenado, mas depois ficou livre e até hoje não se sabe o que aconteceu
com ele — contou.
Outro ponto da delegada foi quando explicou que a
Lei não engloba agressão só entre homem e mulher, mas também entre mulheres
(parentes, companheiras, patroa e empregada etc.). Porém, não são todas as
Comarcas que aceitam essas variações.
O segundo palestrante do dia foi o doutor José
Miños Piñero filho, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro
(TJRJ), discursou sobre o “PSL 236/2012 — Reforma do Código Penal — A busca de
um Código de condutas para o Brasil de agora e de amanhã”. Piñero Filho contou
sobre o momento de transição do Código Penal brasileiro e explicou que a
mudança é necessária.
— A lei tem de se adaptar à sociedade. Pode ser
vigente, mas não eficaz, pois o grupo social pode não se adaptar às mudanças —
disse.
O desembargador citou pontos importantes no novo
Código, como a redução do número de crimes e o uso de entorpecente.
— no Brasil há cerca de 2.000 crimes. Podemos
cometer um e não sabermos. Com a mudança, haverá uma redução de, pelo menos,
1.000 crimes. Isso não significa diminuição na regulação de casos existentes e
que vão desaparecer. O que vai acontecer é enxugar o Código. Em compensação,
passaremos de 361 para 540 leis. E, quanto ao uso de entorpecente, a proposta é
descriminalizar o uso e criminalizar o uso ostensivo. Ou seja, cabe a cada um
decidir o que quer para si próprio, porém, quer fumar maconha, vai fumar dentro
do seu quarto, de portas fechadas. Não poderá fumar na rua, na frente de
crianças etc. — esclareceu.
Dia
29 — A Copa do Mundo é nossa? - Análise jurídica, política e social do
megaevento no Brasil
O penúltimo dia da II Semana Jurídica tratou de
Copa do Mundo. João Batista Damasceno, juiz de direito do TJRJ e professor da
Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), e Flávio Amaral Garcia,
procurador do Estado do Rio de Janeiro, foram os convidados. A mediação ficou
por conta de Marco Aurélio Peri Guedes, professor da UFRRJ.
O primeiro a falar foi Garcia e seu tema era “A
Lei de Licitações (Lei 8.666/1993) e o Regime Diferenciado de Cotações- RDC
(lei 12.462/2011)”. O procurador explicou o RDC e disse acreditar que o regime
é o futuro para a contratação pública no Brasil.
— Quanto mais eficiente for o processo de
contratação pública menos corrupção terá, pois as chances de burlar o sistema
ficam menores. Mas, não há sistema que seja eficiente o bastante quando há
gente má intencionada no meio — afirmou.
João Damasceno debateu sobre “A Lei Geral da Copa
– Lei 12.663/2012”, tratou dos interesses econômicas por detrás de grandes
eventos ligados ao desporto e mencionou a Federação Internacional de Futebol
(FIFA) em seu discurso.
— A Lei da Copa faz da FIFA uma pessoa jurídica
internacional e atribui a ela um status de “A” entidade que regula o futebol
mundial, mas ela não é; é só mais uma. É através do desporto que diversos
países se juntam. O capital chega e promove isso — contou.
Dia
30 — A Constituição Cidadã e as transformações sociais
O último dia da II Semana Jurídica foi encerrado
com chave de ouro. Dois palestrantes, bem difundidos na área jurídica,
contribuíram com suas experiências pessoais e profissionais no cotidiano de
suas profissões para o público presente e atento no Auditório do IM. Além
deles, o professor da UFRRJ, Rodrigo Tavares, mediou mais uma vez os debates.
Nagig Slaibi Filho, presidente da Sexta Câmara Cível
do Tribunal de Justiça, vice-presidente do Fórum Permanente de Direito Constitucional
e desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), foi o primeiro
a falar. Seu tema era “Os 25 anos da Constituição Cidadã”.
Bem humorada e à vontade, Slaibi Filho deu uma
aula de história do Direito, passando por várias décadas e contando diversos
casos curiosos no Brasil em épocas distintas, sempre usando uma linguagem
clara, objetiva e atraente.
Ao explicar o que é a Constituição, o
desembargador encorajou o auditório em relação ao poder social de cada
indivíduo e foi conciso ao falar sobre como as pessoas se conduzem no seu dia a
dia.
— Essa nova Constituição — um texto, um artigo, um
conjunto de normas — é a mais democrática que já tivemos até as oito
anteriores. Metade das Constituições, que eram feitas de cima para baixo, foi outorgada,
até sair a de 1988. Antes dessa agora, a anterior quase não sofreu mudanças
contou Slaibi Filho e complementou seu pensamento ao falar sobre o modo como
interpretamos as coisas. — A norma está na sua cabeça. Não nos conduzimos pelo
texto, pelo papel, pela letra fria da lei. Nos conduzimos pelo modo como vemos
e compreendemos as coisas.
O último a discursar na II Semana Jurídica foi
Paulo Nader, professor emérito da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF),
membro titular da Academia Brasileira de Letras Jurídicas e Juiz de Direito do
TJRJ. Nader falou sobre “A ordem jurídica e suas transformações sociais”, citou
a falta de organização das Defensorias Públicas no Brasil e o difícil acesso de
indivíduos que não têm condições financeiras suficientes em obter auxílio
jurídico público no país.
O professor discursou, também, sobre os
entrelaçamentos das transdisciplinaridades das áreas de conhecimento que o
profissional de Direito pode enfrentar em diversos casos de seu dia a dia, e sobre
o fato de trabalhar em conjunto com profissionais de outros campos do saber.
Em entrevista, Bruno Almeida, coordenador do
DCJur, falou da importância da II Semana Jurídica e afirmou que para ser
estudante de advocacia não é necessário um perfil específico.
— As pessoas se enganam ao pensar que fazer
Direito é a melhor forma de passar num concurso público. É um dos cursos mais
camaleônicos (em relação às diversas oportunidades de cargos e funções do
profissional). O importante é que quem deseja seguir essa área tem de gostar de
muita leitura, ter o interesse em dialogar, em ouvir opiniões diversas e fazer
o contraponto entre as autoridades e sua própria opinião. E trazer grandes
nomes para a Semana Jurídica é fazer com que esse tipo de evento contribua para
a formação do aluno nessas trocas entre palestrantes e estudantes. A Semana
Jurídica sempre foi feita para ligar toda a parte teórica à prática — disse.
Justo
e bem feito
Para os colaboradores
da II Semana Jurídica, alunos de diversos períodos do curso de Direito do IM
que organizaram o evento, participar de toda a montagem das palestras, coffe break, recepção de palestrantes e
demais atividades relacionadas à infraestrutura das atividades, foi um esforço
grande para todos eles.
— Não tínhamos
condições de organizar a Semana sozinhos, e convocamos alunos do curso de
Direito — disseram os integrantes do Centro Acadêmico Paulo Cosme (Capac).
Sobre o sentimento
que ficou após toda a turbulência de programações, os colaboradores afirmaram
restar a satisfação pessoal, a sensação de não acreditar no impossível e
principalmente de superar as adversidades.
— Mesmo para um curso
novo, mostramos que ele é muito mais do que acham por aí. O que fica é a
sensação de querermos fazer sempre o melhor. Trabalhar em equipe, de forma
harmônica, trazer união às pessoas. Alcançamos nossos objetivos — revelou um dos
integrantes do Centro.
Em entrevista ao
Jornal da Graduação, Melina Lopes, ex-aluna do curso de Direito do Instituto
Multidisciplinar, atual caloura da Universidade Federal Fluminense, no mesmo
curso, explicou a importância da II Semana Jurídica e confessou o que ficou
para sempre dentro de si.
— Poder fazer um
grande evento num campus recente e
com um curso pouco conhecido é trazer os holofotes pra cá. A qualidade do
ensino, aqui, é muito boa e isso precisa ser mostrado. Ver a casa cheia, ver
outras pessoas de outros cursos participando e os organizadores se entregarem
de fato para o evento foi muito bom. Aliás, é um ciclo muito bom e importante
que se fechou para mim. Porém, tenho certeza que essas pessoas daqui que
entraram na minha vida não vão sair. Vai deixar saudade, mas deixo a eles minha
amizade e o meu carinho — contou a universitária entre sorrisos e olhos
agitados.
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