sexta-feira, 11 de outubro de 2013

UFRRJ em Nova Iguaçu recebeu grandes nomes do Direito brasileiro na II Semana Jurídica

Por Phelype Gonçalves

Aluno do 6º período de Jornalismo


O Auditório do Instituto Multidisciplinar (IM) do campus Nova Iguaçu da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) recebeu a segunda edição da semana acadêmica do curso de Direito do IM, que aconteceu entre os dias 26 e 30 de agosto, e foi organizada pelo Centro Acadêmico Paulo Cosme (Capac) com total autonomia dos graduandos de diversos períodos do curso de Direito, além de receber o apoio do Departamento de Ciências Jurídicas (DCJur) do Instituto.

Com atividades de segunda a sexta-feira, com início sempre às 8h30 e término às 12h, o evento foi dividido, também, em cinco subtemas e em cada dia havia uma mesa temática específica. No dia 26, a abertura ficou por conta de Márcia Pletsch, vice-diretora do IM; de Bruno Almeida, coordenador do DCJur/IM; e de Pedro Miguel, presidente e representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Jovem.

Márcia falou sobre a importância da universidade pública e de qualidade e Pedro Miguel do valor de os alunos participarem de uma semana acadêmica, pois contribui para o crescimento pessoal e profissional do estudante. Já Bruno Almeida, confirmou as falas da vice-diretora e adicionou:

— Toda universidade pública que queira atingir seu nível em excelência deve contemplar todas as áreas de conhecimento e, para isso, é muito importante disseminar a cultura jurídica na UFRRJ, em todos os níveis, principalmente por não haver essa tradição ainda consolidada na Rural.

Dia 26 — Direitos Humanos

O primeiro dia da II Semana Jurídica trouxe Daniel de Macedo Alves Pereira, defensor público federal; e Marcelo Freixo, deputado estadual do Rio de Janeiro. Além dos convidados, a mesa teve a mediação de Bernardo Brasil Campinho, professor doutor da UFRRJ e da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

Macedo, que é defensor público da União, tinha como tema “Os direitos humanos e a tutela da saúde”. O advogado contou sua trajetória até seu cargo atual, falou sobre situações de desvalorização das profissões de quem deseja cursar advocacia em relação à sociedade, fomentou o estudo para os graduandos e discursou sobre diversos descasos com a dignidade da pessoa humana e que, trabalhar para mudar essa realidade, é seu maior prazer.

— Se existe um funcionário público que acorda feliz cedo pela manhã, sou eu. Ajudar pessoas que enfrentam lutas ferrenhas, morte etc. e ganhar por isso não tem preço — disse o profissional ao discorrer sobre ocorrências nas quais se meteu para contribuir positivamente para a sociedade. — Se não houvesse o poder público, a OAB e outros órgãos existentes, cerca de 130 milhões de brasileiros que ganham menos de dois salários mínimos, excluindo ainda os miseráveis, não poderia arcar com despesas para garantirem defesa jurídica em suas vidas.

Ainda falando de acontecimentos no seu dia a dia de trabalho, Macedo citou a importância da imprensa, falou sobre o descaso com a saúde pública no Estado — pessoas ficavam cerca de 80 dias sentadas em cadeiras esperando ser atendidas para, então, serem internadas — e “cutucou” as redes sociais.

— A imprensa tem um papel fundamental. A gente pode falar o que quiser dela, mas ela surge como um holofote na escuridão — citou Macedo e finalizou com dicas para os estudantes. — Tenham uma palavra na cabeça: obstinação, e sejam um diferencial. Fujam dos ladrões de tempo, como o Facebook, e levem com seriedade seus sonhos.

Marcelo Freixo, com o tema “Os megaeventos na Cidade do Rio de Janeiro”, palestrou de pé e sempre conciso, discursou sobre os investimentos de empresas privadas em concessões públicas, como o Maracanã, sobre o projeto das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) e do modelo de cidade que o Estado vive atualmente. Irônico, Freixo começou o seu debate chamando a atenção para as UPPs.

— O que quer dizer UPP? Unidade de Polícia Pacificadora. Então, existe uma polícia que não é pacificadora, certo? É um raciocínio de lógica. Além disso, o projeto das UPPs não é um projeto de segurança pública, é um projeto de cidade — argumentou o deputado ao caracterizar o porquê das Unidades. — Exceto três delas, todas estão na Zonal Sul. As que não estão são: a da Favela do Batan, em Realengo; a da Cidade de Deus; e a do Complexo do Alemão. As duas primeiras se localizam em áreas onde o controle era de milícias. A última foi onde ocorreram arrastões, queima de ônibus etc. As UPPs são estrategicamente um projeto de cidade para que os grandes investidores possam investir nas áreas onde o dinheiro circula no Rio de Janeiro: a Barra da Tijuca e a Zona Sul.

Perguntado pelo Jornal da Graduação de que forma, além de votações e protestos, a sociedade pode contribuir e trabalhar em conjunto com órgãos que lutam pela educação, pela população e pela cidade, e que quase sempre são abafados por grandes interesses empresariais e midiáticos, Freixo falou sobre o momento das revoltas contemporâneas e fez uma ponte com manifestações brasileiras mais antigas.

— Não somos contra a empresa privada. Investimento é bom. O que não pode acontecer é o interesse privado se sobrepor ao público. Nenhuma experiência de nossas grandes manifestações como a de 64 e 68 (se referindo à luta contra o Regime Militar) servem para explicar o que vivemos hoje. O momento é completamente diferente e essas revoltas atuais tiveram uma força muito grande graças à internet. As coisas estão mudando e a mídia ninja, por exemplo, faz hoje o que jornalistas de rádio já faziam antigamente; a diferença é que agora tem imagem. Além disso, não é verdade que para ser bom tem de ser privado. Isso é um debate de opiniões que vivenciamos atualmente.

Dia 27 — O Novo Código Ambiental e a Degradação do Meio Ambiente

O segundo dia de palestras teve a sua mesa voltada para o Direito Ambiental. Duas professoras falaram sobre o tema. A primeira delas foi Tatiana Cotta Gonçalves Pereira, professora da UFRRJ. A mediação foi do professor Rodrigo de Souza Tavares, também da Rural.

Tatiana tratou de “O Direito Ambiental no entorno da Baixada Fluminense” e trouxe suas pesquisas para compartilhar com o auditório. A docente falou da importância que os profissionais do Direito deveriam dar para o lado ambiental e apresentou dados críticos de Seropédica e Itaguaí em relação à poluição, à contaminação do solo e à poluição sonora.

— Seropédica e Itaguaí são áreas de extração de areia, onde tiram tudo o que precisam e não há nenhum cuidado com o solo. Há locais que você não pode nem pisar devido ao altíssimo grau de contaminação. O que falta para as pessoas que trabalham com o meio ambiente, inclusive para os profissionais de Direito, é a visão de identificação a respeito dos problemas sociais que são, em sua grande maioria, ambientais — revelou.

Já Sonia Rabelo, ex-vereadora do Rio de Janeiro e professora da Lincoln Institue of Land Policy, tinha como debate os “Megaeventos, especulação imobiliária e a mercantilização do meio ambiente no Estado do Rio de Janeiro”. A professora apresentou panoramas de locais que vão ser alterados no Rio para abrigar instalações para a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016, além de mostrar lugares onde haverá desapropriações de áreas públicas para a propriedade e interesses privados. Reforçou, também, a necessidade do conhecimento do Direito Ambiental para os graduandos das faculdades de advocacia.

— O cidadão que não conhece como funciona o Direito Ambiental não pode colaborar com os avanços jurídicos na área. É preciso conhecer para saber o que e como mudar. Cerca de 86% da população brasileira vive nas cidades e, nas faculdades de Direito, sequer a área ambiental é ensinada — alertou.

Dia 28 — O anteprojeto do novo Código Penal e a Lei Maria da Penha

No terceiro dia da II Semana Jurídica, o tema da mesa foi Direito Penal. O coordenador do curso de Direito do Instituto Multidisciplinar da UFRRJ, Paulo Cosme de Oliveira, foi o mediador das palestras.

A doutora Teresa Maria Rocha de Lima Pezza, delegada da polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro (PECERJ), falou sobre “Lei Maria da Penha — Lei 11.340/2006” e citou diversas ramificações que a norma tem, além de contar a história de Maria da Penha Maia Fernandes e como ela contribuiu e contribui para a luta em defesa dos direitos das mulheres.

— Maria da Penha teve um marido que tentou matá-la duas vezes. Na primeira, ele forjou um assassinato: deu um tiro nela, quebrou vidros e coisas na casa para simular uma briga. Maria não morreu e contou o caso para a polícia; o marido não foi preso e ela ficou paraplégica. Na segunda vez, o marido tentou eletrocutá-la e, mais uma vez, ela sobreviveu. Então começaram diversas manifestações a respeito do caso e criaram a Lei. O marido foi condenado, mas depois ficou livre e até hoje não se sabe o que aconteceu com ele — contou.

Outro ponto da delegada foi quando explicou que a Lei não engloba agressão só entre homem e mulher, mas também entre mulheres (parentes, companheiras, patroa e empregada etc.). Porém, não são todas as Comarcas que aceitam essas variações.

O segundo palestrante do dia foi o doutor José Miños Piñero filho, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), discursou sobre o “PSL 236/2012 — Reforma do Código Penal — A busca de um Código de condutas para o Brasil de agora e de amanhã”. Piñero Filho contou sobre o momento de transição do Código Penal brasileiro e explicou que a mudança é necessária.

— A lei tem de se adaptar à sociedade. Pode ser vigente, mas não eficaz, pois o grupo social pode não se adaptar às mudanças — disse.

O desembargador citou pontos importantes no novo Código, como a redução do número de crimes e o uso de entorpecente.

— no Brasil há cerca de 2.000 crimes. Podemos cometer um e não sabermos. Com a mudança, haverá uma redução de, pelo menos, 1.000 crimes. Isso não significa diminuição na regulação de casos existentes e que vão desaparecer. O que vai acontecer é enxugar o Código. Em compensação, passaremos de 361 para 540 leis. E, quanto ao uso de entorpecente, a proposta é descriminalizar o uso e criminalizar o uso ostensivo. Ou seja, cabe a cada um decidir o que quer para si próprio, porém, quer fumar maconha, vai fumar dentro do seu quarto, de portas fechadas. Não poderá fumar na rua, na frente de crianças etc. — esclareceu.

Dia 29 — A Copa do Mundo é nossa? - Análise jurídica, política e social do megaevento no Brasil

O penúltimo dia da II Semana Jurídica tratou de Copa do Mundo. João Batista Damasceno, juiz de direito do TJRJ e professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), e Flávio Amaral Garcia, procurador do Estado do Rio de Janeiro, foram os convidados. A mediação ficou por conta de Marco Aurélio Peri Guedes, professor da UFRRJ.

O primeiro a falar foi Garcia e seu tema era “A Lei de Licitações (Lei 8.666/1993) e o Regime Diferenciado de Cotações- RDC (lei 12.462/2011)”. O procurador explicou o RDC e disse acreditar que o regime é o futuro para a contratação pública no Brasil.

— Quanto mais eficiente for o processo de contratação pública menos corrupção terá, pois as chances de burlar o sistema ficam menores. Mas, não há sistema que seja eficiente o bastante quando há gente má intencionada no meio — afirmou.

João Damasceno debateu sobre “A Lei Geral da Copa – Lei 12.663/2012”, tratou dos interesses econômicas por detrás de grandes eventos ligados ao desporto e mencionou a Federação Internacional de Futebol (FIFA) em seu discurso.

— A Lei da Copa faz da FIFA uma pessoa jurídica internacional e atribui a ela um status de “A” entidade que regula o futebol mundial, mas ela não é; é só mais uma. É através do desporto que diversos países se juntam. O capital chega e promove isso — contou.

Dia 30 — A Constituição Cidadã e as transformações sociais

O último dia da II Semana Jurídica foi encerrado com chave de ouro. Dois palestrantes, bem difundidos na área jurídica, contribuíram com suas experiências pessoais e profissionais no cotidiano de suas profissões para o público presente e atento no Auditório do IM. Além deles, o professor da UFRRJ, Rodrigo Tavares, mediou mais uma vez os debates.

Nagig Slaibi Filho, presidente da Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça, vice-presidente do Fórum Permanente de Direito Constitucional e desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), foi o primeiro a falar. Seu tema era “Os 25 anos da Constituição Cidadã”.

Bem humorada e à vontade, Slaibi Filho deu uma aula de história do Direito, passando por várias décadas e contando diversos casos curiosos no Brasil em épocas distintas, sempre usando uma linguagem clara, objetiva e atraente.
Ao explicar o que é a Constituição, o desembargador encorajou o auditório em relação ao poder social de cada indivíduo e foi conciso ao falar sobre como as pessoas se conduzem no seu dia a dia.

— Essa nova Constituição — um texto, um artigo, um conjunto de normas — é a mais democrática que já tivemos até as oito anteriores. Metade das Constituições, que eram feitas de cima para baixo, foi outorgada, até sair a de 1988. Antes dessa agora, a anterior quase não sofreu mudanças contou Slaibi Filho e complementou seu pensamento ao falar sobre o modo como interpretamos as coisas. — A norma está na sua cabeça. Não nos conduzimos pelo texto, pelo papel, pela letra fria da lei. Nos conduzimos pelo modo como vemos e compreendemos as coisas.

O último a discursar na II Semana Jurídica foi Paulo Nader, professor emérito da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), membro titular da Academia Brasileira de Letras Jurídicas e Juiz de Direito do TJRJ. Nader falou sobre “A ordem jurídica e suas transformações sociais”, citou a falta de organização das Defensorias Públicas no Brasil e o difícil acesso de indivíduos que não têm condições financeiras suficientes em obter auxílio jurídico público no país.

O professor discursou, também, sobre os entrelaçamentos das transdisciplinaridades das áreas de conhecimento que o profissional de Direito pode enfrentar em diversos casos de seu dia a dia, e sobre o fato de trabalhar em conjunto com profissionais de outros campos do saber.

Em entrevista, Bruno Almeida, coordenador do DCJur, falou da importância da II Semana Jurídica e afirmou que para ser estudante de advocacia não é necessário um perfil específico.

— As pessoas se enganam ao pensar que fazer Direito é a melhor forma de passar num concurso público. É um dos cursos mais camaleônicos (em relação às diversas oportunidades de cargos e funções do profissional). O importante é que quem deseja seguir essa área tem de gostar de muita leitura, ter o interesse em dialogar, em ouvir opiniões diversas e fazer o contraponto entre as autoridades e sua própria opinião. E trazer grandes nomes para a Semana Jurídica é fazer com que esse tipo de evento contribua para a formação do aluno nessas trocas entre palestrantes e estudantes. A Semana Jurídica sempre foi feita para ligar toda a parte teórica à prática — disse.

Justo e bem feito

Para os colaboradores da II Semana Jurídica, alunos de diversos períodos do curso de Direito do IM que organizaram o evento, participar de toda a montagem das palestras, coffe break, recepção de palestrantes e demais atividades relacionadas à infraestrutura das atividades, foi um esforço grande para todos eles.

— Não tínhamos condições de organizar a Semana sozinhos, e convocamos alunos do curso de Direito — disseram os integrantes do Centro Acadêmico Paulo Cosme (Capac).

Sobre o sentimento que ficou após toda a turbulência de programações, os colaboradores afirmaram restar a satisfação pessoal, a sensação de não acreditar no impossível e principalmente de superar as adversidades.

— Mesmo para um curso novo, mostramos que ele é muito mais do que acham por aí. O que fica é a sensação de querermos fazer sempre o melhor. Trabalhar em equipe, de forma harmônica, trazer união às pessoas. Alcançamos nossos objetivos — revelou um dos integrantes do Centro.

Em entrevista ao Jornal da Graduação, Melina Lopes, ex-aluna do curso de Direito do Instituto Multidisciplinar, atual caloura da Universidade Federal Fluminense, no mesmo curso, explicou a importância da II Semana Jurídica e confessou o que ficou para sempre dentro de si.


— Poder fazer um grande evento num campus recente e com um curso pouco conhecido é trazer os holofotes pra cá. A qualidade do ensino, aqui, é muito boa e isso precisa ser mostrado. Ver a casa cheia, ver outras pessoas de outros cursos participando e os organizadores se entregarem de fato para o evento foi muito bom. Aliás, é um ciclo muito bom e importante que se fechou para mim. Porém, tenho certeza que essas pessoas daqui que entraram na minha vida não vão sair. Vai deixar saudade, mas deixo a eles minha amizade e o meu carinho — contou a universitária entre sorrisos e olhos agitados.

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